Um dos personagens mais famosos do bairro de Santa Teresa foi a mecenas Laurinda Santos Lobo, que morava em um luxuoso palacete na Rua Murtinho Nobre, e promovia ali concorridos saraus e reuniões literárias.
Com a morte de Laurinda, o palacete em estilo neocolonial foi saqueado, abandonado e chegou a ser invadido por um traficante.
Em 1996, a Prefeitura do Rio de Janeiro tomou posse do imóvel e o transformou em um centro cultural, inaugurado no ano seguinte.
Vamos conhecer hoje a história do Parque das Ruínas, um dos lugares mais agradáveis de Santa Teresa e da Cidade Maravilhosa, com direito a belíssimas vistas panorâmicas.
Neste palacete construído na segunda metade do século XIX, na Rua Murtinho Nobre, próxima ao Curvelo, em Santa Teresa, vivia a mecenas Laurinda Santos Lobo, sobrinha do conceituado homeopata e ministro Joaquim Murtinho, de quem herdara o imóvel.
No então denominado ‘Chalé Murtinho’ realizavam-se badaladas festas frequentadas por nomes como Isadora Duncan, Heitor Villa-Lobos, Oswaldo Cruz, o escritor Anatole France, o poeta Félix Pacheco, entre outros.
Dividindo-se entre o Rio e Paris, onde passava várias temporadas, Laurinda reformou o palacete, dando-lhe um aspecto neocolonial. Foram introduzidos uma superposição de motivos decorativos e azulejaria. Os adornos do interior foram inspirados nos salões literários de Paris.
Segundo ex-empregados, havia uma cor para cada cômodo. Um dos mais luxuosos era o ‘salão azul’, que abrigava bronzes, jades verdes, sedas douradas, tapetes e móveis orientais.
Eram ao todo seis salas, três salões, quatro quartos, mirante, capela, banheiros, três quartos de empregados, cozinha, lavanderia, sala de costura, despensa e duas copas.
Laurinda não teve filhos e após sua morte, em 16 de julho de 1946, o palacete deixou de viver a efervescência do passado. Foi deixado em testamento para a Sociedade Homeopática, que nunca chegou a tomar posse. Abandonado à própria sorte, sem vigias, o imóvel foi saqueado por moradores de Santa Teresa (‘de todas as classes sociais’, como diz a poeta Raquel Jardim, ex-administradora regional de Santa Teresa). Caminhões eram vistos na porta da casa. Telhas, janelas, móveis e até o antigo piano de Laurinda foram levados. O palacete também foi invadido por moradores de rua e por um traficante, que sublocava o terreno para outras famílias.
Em 1996, a Prefeitura do Rio de Janeiro e a Administração Regional do bairro deram fim ao triste capítulo de abandono que vivia o palacete da Murtinho Nobre. Após minuciosa restauração do que ainda restara de pé, foi feita no local uma intervenção moderna e criado o Parque das Ruínas, uma área de lazer para os moradores de Santa Teresa e um espaço cultural para a cidade do Rio de Janeiro.
Com a restauração do imóvel, projeto premiado dos arquitetos Ernani Freire e Sônia Lopes, criou-se uma ponte entre o passado e o presente. Entre as paredes nuas foram instaladas passarelas e escadas metálicas que conduzem o visitante a um tempo e espaço imaginário. As estruturas criadas fortalecem o imóvel e criam espaços de circulação interna em vários níveis, até alcançar o último, onde situa-se o mirante. Segundo a Prefeitura do Rio o objetivo era valorizar as ruínas, um elemento marcante na paisagem do bairro, para que pudessem ser desfrutadas como espaço revitalizado adaptado a novas funções.
O Parque das Ruínas possui auditório com capacidade para 100 pessoas, um palco de 88 metros quadrados, sala de exposições temporárias e cafeteria. O espaço costuma abrigar espetáculos teatrais e circenses, oncertos, seminários, shows, eventos e palestras.
No último piso encontra-se um mirante que oferece uma vista panorâmica privilegiada do Centro do Rio, Baía da Guanabara e da Zona Sul. Dali podem ser contemplados vários marcos da cidade, como a Central do Brasil, os Arcos da Lapa, a Catedral Metropolitana, o Aeroporto Santos Dumont, entre muitos outros.
No terreno do Parque, onde Laurinda pretendia construir um jardim, hoje são realizados espetáculos abertos à comunidade, como apresentações teatrais, circenses e musicais. Aos domingos de manhã costumam acontecer ali espetáculos infantis que atraem muitos pais e filhos para o local.
A cafeteria do espaço cultural localiza-se em uma esplanada à italiana e possui forma de coreto, por ter sido encontrado no projeto da casa um coreto que jamais chegou a ser construído.
Nascida em Cuiabá em 1878, herdeira da Companhia Mate Laranjeira, Laurinda Santos Lobo foi batizada por João do Rio de “Marechala da Elegância”. A mecenas chegou a presidir o Conselho da Federação Brasileira para o Progresso Feminino e não hesitava em usar seu prestígio em prol das lutas feministas. Em sua homenagem, Heitor Villa Lobos compôs a peça “Quattour – Impressões da Vida Mundana”.
Texto: Leo Ladeira
Fotos: Alexandre Siqueira e Leo Ladeira
SERVIÇO
PARQUE DAS RUÍNAS
Endereço: Rua Murtinho Nobre, 169 – Santa Teresa
Rio de Janeiro (RJ)
Horário: terça a domingo, 8h às 18h
Admissão: Gratuita
Fontes de Consulta:
- Rio de Janeiro: Preservação & Modernidade – Pref.do RJ – Sextante Artes – 1998.
- Laurinda Santos Lobo: mecenas, artistas e outros marginais em Santa Teresa. Hilda Machado. Editora, Casa da Palavra, 2002.
- ‘O Glamour da Ruína’ – Veja-Rio: 6 de novembro de 1996.